sexta-feira, 21 de março de 2008

Molde

Na terça-feira passada fomos ver uma fábrica cerâmica por dentro. Que coisa espantosa! Já vem de longe a minha atracção por zonas industriais, maquinarias e afins. É aquela repetição, o pormenor, a ordem... algo estranho de facto. É o espanto perante a aparente ordem das coisas.

Aqui fica uma visita à ...

E assim...


... começámos logo por nos espantar com um enorme forno à entrada do circuito!


Depois lá fomos nós, através de um corredor suspenso percorrer a fábrica!


Parámos na zona dos moldes. Muitos, muitos muitos moldes!!! Prateleiras cheias deles, salas repletas de moldes.


Em baixo máquinas e homens equiparavam esforços na produção de peças. Incrível rapidez, movimentos repetitivos de ambas as partes. Deu gosto olhar. Não sei é se seria coisa que conseguisse fazer o dia inteiro.


Mais à frente... vários carrinhos cheios de peças em diferentes fases de secagem. Um mar de pratos!

Do outro lado observámos o que muito tinha para ver a zona de vidragem. Mais uma vez máquinas com várias funções a coordenar movimentos com o trabalho humano. Sempre muita coisa a passar-se lá em baixo que era difícil escolher a zona de observação.


Por fim, chegámos à área de pintura: senhoras sentadas de ambos os lados de um tapete rolante que ia transportando peças por pintar ou já prontas. Cada uma das senhoras pintava uma parte da peça com incrível rapidez e depois punha no tapete para voltar a ser agarrada mais à frente. Impressionante a velocidade e a forma certeira como este trabalho é executado.

Aqui ficam alguns painéis concebidos pela Molde.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Jardim

No primeiro dia do workshop só começámos a quebrar a "pintura" ao fim da tarde, com a dança infernal ao som de música ritmada e de batidas selváticas de mãos e instrumentos musicais mais ou menos improvisados.
Antes mostrávamo-nos todos tão compenetrados, de humor tão acertado com o momento, tudo tão certinho, a máscara sorria prazenteira à sombra, como que a fazer-lhe sinais para um pacto qualquer, umas tréguas de medo. Mas a sombra não se vende, toda a gente sabe disso.
Então, ao fim daquela tarde de sábado a dança soltou-nos um pouco os temores, evadimo-nos um pouco da prisão de medo e deixámos que as sombras espreitassem. Vieram até nós, abraçando-nos o chamamento, correram livres entre nós. A energia a circular... maravilhoso!

No domingo, o segundo dia do workshop começou ameno também. Depois fomos ao jardim procurar uma inspiração em que nos ajudasse mais tarde no confronto com a Sombra. Era ainda cedo, tudo tão calmo, apenas os sem-abrigo sentados nos bancos a partilhar o pequeno-almoço com os pombos. Alguns ainda deitados por entre papelões e sacos. Tudo tão calmo, com o brilho límpido do sol. Tudo tão fácil.
Um grande contraste com o final de tarde atribulado, cheio de interferências próprias da ocasião, afinal. Muita coisa foi dita e também não-dita. O mais importante é sentir tudo, a alegria e a tristeza, os momentos melhores e piores como um todo integrador. A partir daí podemos caminhar para a cura interna. Respirar a dor, a raiva, a revolta, o abandono... a seu tempo as dificuldades de hoje são as soluções de amanhã.
É preciso é acreditar, erguer o "instrumento e poder" e seguir em frente.

quarta-feira, 12 de março de 2008


No último fim-de-semana foi tempo de prosseguir com a caminhada do herói. Há quase um ano que iniciei este processo tão belo e profundo. O workshop que me ajudou a descobrir esse herói juntamente com outros amigos de busca foi muito intenso, vivido com muitas emoções fortes, muitas descobertas importantes. Foi marcante também pela "visão" que me ajudou a vislumbrar uma forma que se adapta mais a mim, que tem mais a ver comigo neste momento - o caminho da criatividade, a cerâmica!

Um novo capítulo da nossa história heróica escreveu-se neste fim-de-semana - o Herói confronta a Sombra. Prometia à partida desafios poderosos. Contudo o sábado começou leve, ou melhor, quase leve. Algumas partilhas relacionadas com o passado e o momento presente. Alguma confissões emocionadas. Parecia uma calmaria que anunciava uma tempestade grandiosa. E não foi caso para menos.









domingo, 2 de março de 2008

Soube bem hoje revisitar locais tão meus conhecidos, tão banais, até, mas muito belos e ispiradores. Sempre inspiradores e desejados. Com muitas memórias.
O mais importante é regressar e depois olhar com os olhos do presente as imagens do passado. Recriar a história pelo novo olhar. O olhar mais actual.

Descobri uma feira de artesanato na Praça da Alegria. Que lindo nome para um sítio também tão cheio de memórias. Alegria. É a coisa mais bonita.

Aí descobri umas cartas de jogar com desenhos: pássaros exóticos, peixes, flores entre muitos outros. E índios.A minha paixão mais recente e também mais antiga do que posso imaginar.

Persépolis II

Li esta crónica de Laurinda Alves sobre o belo e comovente filme Persépolis e apeteceu-me "colá-lo" aqui. Talvez por ter sido escrito por uma pessoa que muito admiro por variados motivos. Há algum tempo atrás tive o privilégio de a conhecer pessoalmente e a minha admiração cresceu ainda mais. Por muitos e variados motivos.
Por tudo isso e muito mais... aqui fica...
"Persépolis

O filme de que se fala e não se pode perder. Muito já foi dito e escrito sobre Persépolis e Marjane Satrapi mas não me parece demais voltar ao tema.
Persépolis é tudo. aquilo que outros classificaram como "arte de grande nível, singular, formidável, político, patético, essencial, terno, provocador, divertido e diferente de tudo o que já foi feito". O Ípsilon escreveu sobre isto e muita mais na semana passada e, noutro contexto, a Newsweek sublinhou a diferença de Persépolis declarando. aos leitores que "não é como nenhum outro filme de animação que já tenham visto". E não. é, de" facto, embora tenha havido outros radicalmente diferentes em registas cinematográficos igualmente surpreendentes (estou a pensar em Sin City, por exemplo).
Há, no entanto, mais adjectivos que se aplicam a Persépolis e, particularmente, a Marjane Satrapi. Elegante pode ser um deles. Profunda e comovente, são certamente outros. E por aí adiante.
A elegância de Marjane não é uma elegância no sentido comum e, porventura, mais frívola da palavra. Não é uma questão de moda, trata-se de uma elegância estrutural que se traduz numa contenção inteligente de palavras e gestos, numa depuração narrativa eficaz e num humor fino, por vezes explosivo, que parte sempre da auto-ironia de quem fala na primeira pessoa mas não se leva demasiado a sério.
Há outros pormenores de elegância no filme como a escolha de Catherine Deneuve e Chiara Mastroiani para darem voz às personagens principais e, ainda, a traço das figuras e cenários.
Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud fizeram um filme quase todo a preto e branco mas encontraram tonalidades admiráveis para desenhar o amor e o ódio, a confiança e o medo e, também, para retratar a noite escura, ampliar a penumbra dos quartos e projectar as sombras nas ruas. Todo o filme é muito gráfico. Há, inclusivamente, uma espécie de preto-alegria e preto-ternura que aliviam o lado mais negro do filme. Os autores usaram, ainda, um espectro muito largo de brancos que vão do branco-susto ao branco-esperança, passando pelo branco-doce e caloroso que emana da cabelo da avó e do tio Anoush, dois pilares da existência de Marjane.
A atitude e a motivação dos personagens é sempre acentuada por essa mesma paleta de cores (ler: preto e branco) e o contraste entre bons e maus deriva especialmente da mancha negra que estes últimas arrastam consigo. São, quase sempre vultos sinistros que emergem das trevas e usam a noite para agir. Cambardes e prepotentes, claro.
Persépolis conta uma história que todos sabemos mais ou menos, embora com outros contornos. Mais humanas e menos políticos no sentido mediático do termo. Não se trata de um documentário político e muito menos de uma análise fria e objectiva da história recente da Irão. É muita mais que isso. É a história de uma família tocada pela guerra, devastada por perseguições, prisões e execuções sumárias de tios, primos, amigos e conhecidos. Uma família onde existe uma filha pequena que assiste a tudo e é obrigada a exilar-se demasiado cedo na Áustria. Por ser uma rapariga iraniana e usar véu na cabeça, Marjane vive as circunstâncias das mulheres da sua cultura. Olhada e apontada com desconfiança, revela um humor feroz mas acaba por encontrar o seu lugar no mundo e triunfar. Não de uma forma triunfalista ou moralista mas daquela forma subtil e invisível que tem a ver com a verdade. E com a liberdade de sermos quem somos, aceitando as nossas origens e história".
Laurinda Alves - Público, 29/02/08