domingo, 11 de maio de 2008

Heaven have mercy!



Finalmente chegou a noite da descida aos infernos, a voz ímpar de Diamanda Galás foi quem nos guiou, ensinando-nos a olhar as surpresas da caixa de Pandora de olhos bem abertos. Not for the weak. Ou melhor, para os fracos, especialmente para os fracos. Para todos os que têm tanto medo, mas mesmo assim continuam em frente, pois sabem, lá no fundo, que não se pode mais regressar àquilo que já foi.
O caminho aponta para ali, em frente, chegou o momento de arriscar tudo, dizer adeus à pele morta e ser livre. Sim, sentir liberdade profunda e ser autêntico! Ser louco e acreditar no impalpável, nas formas que só ainda existem dentro deste coração selvagem! Seguir, apesar das dúvidas, medos, dores, indiferença nos olhares! Sim, caminhar sem ver os pés na noite escura e confiar em tudo e nada, no visível e no invisível, apelando àquilo que mais fundo fala em nós.
Sinto a energia desta voz vibrar poderosa e isso faz-me lembrar quem sou e por que estou aqui. A escuridão e a luz de mãos dadas, puras, autênticas. As faces múltiplas do ser e da vida, a versatilidade que desfaz a rigidez.
Viver a música de Diamanda Galás é sempre um acontecimento intenso que nos faz sentir o sangue a fervilhar nas veias, é um motor de propulsão que nos desperta a consciência, tantas vezes entorpecida no quotidiano. Não se consegue ficar indiferente, acorda-nos, transporta-nos para sítios onde poucas vezes temos coragem de entrar...
No sábado assisti a um portento de espectáculo, a figura, a voz, o piano, o jogo de luzes... todos os elementos nos ajudaram a embarcar nessa viagem quase meditativa, quase irreal , tão perto tão longe. Há morte e escuridão em cada um dos nossos passos, mas é daí também que provém a vida, o sangue, o amor, a intensidade, a força maior dentro de nós.
Admiro esta artista inclassificável e vi a forma como se entregou, a dedicação de corpo e alma - recebi e dei também parte de mim - a minha consciência, a presença intensa, total.

sábado, 12 de abril de 2008

Uma visita ao Museu da Cerâmica


Na sexta-feira dia 11 de Abril fomos (finalmente!!!) visitar o Museu da Cerâmica das Caldas da Rainha, situado na Quinta Visconde de Sacavém (e ultra-romântico, como nos foi descrito logo à entrada). Este museu existe oficialmente desde 1983, mas o conjunto arquitectónico data da década de 1890 sendo cosntituído por um palacete romântico e dos seus jardins românticos, com lagos, floreiras e alamedas, decorado com elementos cerâmicos, nomeadamente azulejos, gatos e zé-povinhos muito patuscos, feitos no Cencal.
As peças do museu representam uma amostra da cerâmica característica de vários pontos do país e do estrangeiro, bem como expor a produção cerâmica de Caldas da Rainha que vai do século XVI atá aos nossos dias, incluindo exemplos da dita "cerâmica arcaica" e da produção artística de autor do século XIX onde se destaca as obras de Rafael Bordalo Pinheiro.
Foi à entrada do palacete do Visconde da Sacavém que a nossa professora de História da Cerâmica (também a directora do museu) iniciou a nossa visita guiada.
Aqui a professora aponta para a peça mais antiga do espólio - data do Séc. XVI.











Na antiga cozinha do palacete podemos apreciar uma amostra da cerâmica tradicional proveniente de todo o país. O espaço é pequeno para albergar as muitas peças que existem... era bom que o palacete fosse um pouco maior! Como agora temos muito o hábito de tocar nas peças para avaliar o peso, os fretes, etc., não foi fácil de resistir a "mexericar" um pouco...

Algumas reproduções feitas a partir das peças de Maria dos Cacos.





Um fantástico serviço de chá "Jibóia", com a marca de Francisco d'Avelar, do Séc. XIX. Apesar de gostar tanto de chá, não sei se me sentiria inspirada a beber ali um...

Este bule "Macaco" (com a marca de António Alves Cunha, Caldas da Rainha, Séc. XX) é mesmo muito divertido!
Bules, açucareiros, canjirão e garrafas vassoura... mas que conjunto pitoresco!




Esta ranita foi uma das minhas peças favoritas, descobri-a no atelier do museu. É mesmo querida!

terça-feira, 8 de abril de 2008

Ela está de volta!

A fantástica Diamanda Galás vem de novo acordar-nos os ouvidos! É já no dia 10 de Maio, na Aula Magna de Lisboa! Claro que não quero perder. Já tive o prazer de assistir a três concertos em Lisboa e não me canso. Isto, apesar de não ter o costume de ouvir muito a música dela no meu dia-a-dia. houve tempos em que ouvia muito, mas agora não. Enfim, fases...
Aqui fica um artigo interessante:


"The queen of scream -

With a voice that can shatter windows and a taste for the dark, Diamanda Galas is not for the weak.

"HATE can move mountains," says the grand diva of darkness, Diamanda Galas, her voice husky, volatile, ready to cackle and ready to skewer. The avant-garde superstar is perspiring on a humid morning in the nocturnal enclosure at New York's Central Park Zoo and she draws aside her webbed shawl to air her bust. "Love? Hmm, I don't know. But hate, yeah. Hate can move mountains; anger is fuel."

The singer coos at the hanging bats - "gorgeous" - and then pours a little top-shelf vitriol. "You know those f---ing uptown bitches that parade around with their disgusting handbag dogs? They were campaigning to have New York's wild bats poisoned, talking shit about rabies and disease. What it really was, they were scared one would swoop down and carry little poochie away," she says, spreading her fingers like wings. "I want every f---ing chihuahua in New York snatched by bats."

Venom turned an inhibited Greek-American girl from San Diego into a solo performer unique and ferocious, the psychotic standout of recent years at the Sydney Festival, the Melbourne International Arts Festival, the Adelaide Festival, and a headliner in Italy, Spain, Mexico and other nations with a taste for emotion served up strong. She's a manic-depressive, not desirous of anyone's sympathy or brain-chemistry interpretations but one of that rare breed whose curse is coupled with the will and talent to turn the extremes into powerful, structurally sound art.

So venom takes but it also gives. Just like Galas, who has a little news for the columnist and ABC talking-head Andrew Bolt. He dissed her shows at the 2005 Melbourne International Arts Festival without even seeing them, calling them "incomprehensible, if not pretentious" and got sweaty about taxpayers' money going on performances in which Galas sang in foreign tongues without surtitles, asking why import "this kind of act" at the expense of "the Melbourne Symphony Orchestra or our top actors and singers?"

"That Bolt, he's a real f---ing idiot, man, a real halfwit," says Galas, in a cab from the zoo to an air-conditioned patch of her home turf in Manhattan's East Village. "If you have questions, as you would in any operatic production, be it Tosca, be it Wagner, get the f---ing notes." Galas called Bolt a masturbator at her next Melbourne show "in Greek, and half the audience laughed, even if that motherf---er expects everyone in Australia to only speak English".

Detractors are old hat to Galas, who in 1991 contributed to AIDS awareness (the virus killed her brother) by performing a show, Plague Mass, at New York's Cathedral of St John the Divine, complete with the song Confessional (Give Me Sodomy Or Give Me Death) and clad only in red paint and a loincloth. She's used to a bit of stick.

"Hey, I'll tell you what, I survived hepatitis C; I took chemotherapy; I survived all sorts of shit. Unless you put a gun to my head, I'm not dying in the near future. I'm going to sing until I drop dead, so f--- you."

Hepatitis came from sharing needles in the 1970s, in the aftermath of her unconventional studies in biochemistry at the University of Southern California.

"You see all these people researching on the rats and I had a perfect opportunity to inject myself with all this shit," she says. Galas and a pack of medical students hit the labs hard: "We decided we were going to do research on ourselves. We did some crazy shit and that's why I think I ended up making music."

It was through such methods that Galas found her trademark vocalisations, the multi-octave hurricanes of sound that seem to carry all the terror and madness in the universe. They manifested when she locked herself in anechoic chambers on high doses of LSD. "You can scream and you can do whatever you're going to do that's governed by your mental state and nobody's going to hear you, so there's no censor. I wanted to have that freedom and I did it and the vocal stuff came out of that," she says.

With hepatitis came abstinence - "You got to decide whether you want to live or die" - but not born-again wowserism. The danger for artists pushing the limits, she says, is forgetting the "edit mode". If they don't know when to slow down, not only might they die, she says, but worse, they will produce self-indulgent trash.

Galas uses her depressive phases, when they ease from pushing her off the circle of the earth and towards the embrace of a noose, to slash the fat from the compositions she races through in her manias. "All sides of my abilities have to come forward to make a product good, because at the end of the day, it's either a good product or it's a bad product," she says.

Given her mania for exactitude, she has cancelled concerts when the pianos supplied and acoustics were sub-par, and Galas has little tolerance for people who talk through a show. "I can make cracks for a while but if somebody doesn't shut up, I show them how to get the f--- out," she says. "Honey, I don't do dinner theatre."

Diamanda Galas sings traditional blues and laments on Guilty, Guilty, Guilty, released on Monday (Mute Records).

"Hey, I'll tell you what, I survived hepatitis C; I took chemotherapy; I survived all sorts of shit. Unless you put a gun to my head, I'm not dying in the near future. I'm going to sing until I drop dead, so f--- you."

Hepatitis came from sharing needles in the 1970s, in the aftermath of her unconventional studies in biochemistry at the University of Southern California.

"You see all these people researching on the rats and I had a perfect opportunity to inject myself with all this shit," she says. Galas and a pack of medical students hit the labs hard: "We decided we were going to do research on ourselves. We did some crazy shit and that's why I think I ended up making music."

It was through such methods that Galas found her trademark vocalisations, the multi-octave hurricanes of sound that seem to carry all the terror and madness in the universe. They manifested when she locked herself in anechoic chambers on high doses of LSD. "You can scream and you can do whatever you're going to do that's governed by your mental state and nobody's going to hear you, so there's no censor. I wanted to have that freedom and I did it and the vocal stuff came out of that," she says.

With hepatitis came abstinence - "You got to decide whether you want to live or die" - but not born-again wowserism. The danger for artists pushing the limits, she says, is forgetting the "edit mode". If they don't know when to slow down, not only might they die, she says, but worse, they will produce self-indulgent trash.

Diamanda uses her depressive phases, when they ease from pushing her off the circle of the earth and towards the embrace of a noose, to slash the fat from the compositions she races through in her manias. "All sides of my abilities have to come forward to make a product good, because at the end of the day, it's either a good product or it's a bad product," she says.

Given her mania for exactitude, she has cancelled concerts when the pianos supplied and acoustics were sub-par, and Galas has little tolerance for people who talk through a show. "I can make cracks for a while but if somebody doesn't shut up, I show them how to get the f--- out," she says. "Honey, I don't do dinner theatre."

Diamanda Galas sings traditional blues and laments on Guilty, Guilty, Guilty, released on Monday (Mute Records)".





sexta-feira, 21 de março de 2008

Molde

Na terça-feira passada fomos ver uma fábrica cerâmica por dentro. Que coisa espantosa! Já vem de longe a minha atracção por zonas industriais, maquinarias e afins. É aquela repetição, o pormenor, a ordem... algo estranho de facto. É o espanto perante a aparente ordem das coisas.

Aqui fica uma visita à ...

E assim...


... começámos logo por nos espantar com um enorme forno à entrada do circuito!


Depois lá fomos nós, através de um corredor suspenso percorrer a fábrica!


Parámos na zona dos moldes. Muitos, muitos muitos moldes!!! Prateleiras cheias deles, salas repletas de moldes.


Em baixo máquinas e homens equiparavam esforços na produção de peças. Incrível rapidez, movimentos repetitivos de ambas as partes. Deu gosto olhar. Não sei é se seria coisa que conseguisse fazer o dia inteiro.


Mais à frente... vários carrinhos cheios de peças em diferentes fases de secagem. Um mar de pratos!

Do outro lado observámos o que muito tinha para ver a zona de vidragem. Mais uma vez máquinas com várias funções a coordenar movimentos com o trabalho humano. Sempre muita coisa a passar-se lá em baixo que era difícil escolher a zona de observação.


Por fim, chegámos à área de pintura: senhoras sentadas de ambos os lados de um tapete rolante que ia transportando peças por pintar ou já prontas. Cada uma das senhoras pintava uma parte da peça com incrível rapidez e depois punha no tapete para voltar a ser agarrada mais à frente. Impressionante a velocidade e a forma certeira como este trabalho é executado.

Aqui ficam alguns painéis concebidos pela Molde.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Jardim

No primeiro dia do workshop só começámos a quebrar a "pintura" ao fim da tarde, com a dança infernal ao som de música ritmada e de batidas selváticas de mãos e instrumentos musicais mais ou menos improvisados.
Antes mostrávamo-nos todos tão compenetrados, de humor tão acertado com o momento, tudo tão certinho, a máscara sorria prazenteira à sombra, como que a fazer-lhe sinais para um pacto qualquer, umas tréguas de medo. Mas a sombra não se vende, toda a gente sabe disso.
Então, ao fim daquela tarde de sábado a dança soltou-nos um pouco os temores, evadimo-nos um pouco da prisão de medo e deixámos que as sombras espreitassem. Vieram até nós, abraçando-nos o chamamento, correram livres entre nós. A energia a circular... maravilhoso!

No domingo, o segundo dia do workshop começou ameno também. Depois fomos ao jardim procurar uma inspiração em que nos ajudasse mais tarde no confronto com a Sombra. Era ainda cedo, tudo tão calmo, apenas os sem-abrigo sentados nos bancos a partilhar o pequeno-almoço com os pombos. Alguns ainda deitados por entre papelões e sacos. Tudo tão calmo, com o brilho límpido do sol. Tudo tão fácil.
Um grande contraste com o final de tarde atribulado, cheio de interferências próprias da ocasião, afinal. Muita coisa foi dita e também não-dita. O mais importante é sentir tudo, a alegria e a tristeza, os momentos melhores e piores como um todo integrador. A partir daí podemos caminhar para a cura interna. Respirar a dor, a raiva, a revolta, o abandono... a seu tempo as dificuldades de hoje são as soluções de amanhã.
É preciso é acreditar, erguer o "instrumento e poder" e seguir em frente.

quarta-feira, 12 de março de 2008


No último fim-de-semana foi tempo de prosseguir com a caminhada do herói. Há quase um ano que iniciei este processo tão belo e profundo. O workshop que me ajudou a descobrir esse herói juntamente com outros amigos de busca foi muito intenso, vivido com muitas emoções fortes, muitas descobertas importantes. Foi marcante também pela "visão" que me ajudou a vislumbrar uma forma que se adapta mais a mim, que tem mais a ver comigo neste momento - o caminho da criatividade, a cerâmica!

Um novo capítulo da nossa história heróica escreveu-se neste fim-de-semana - o Herói confronta a Sombra. Prometia à partida desafios poderosos. Contudo o sábado começou leve, ou melhor, quase leve. Algumas partilhas relacionadas com o passado e o momento presente. Alguma confissões emocionadas. Parecia uma calmaria que anunciava uma tempestade grandiosa. E não foi caso para menos.









domingo, 2 de março de 2008

Soube bem hoje revisitar locais tão meus conhecidos, tão banais, até, mas muito belos e ispiradores. Sempre inspiradores e desejados. Com muitas memórias.
O mais importante é regressar e depois olhar com os olhos do presente as imagens do passado. Recriar a história pelo novo olhar. O olhar mais actual.

Descobri uma feira de artesanato na Praça da Alegria. Que lindo nome para um sítio também tão cheio de memórias. Alegria. É a coisa mais bonita.

Aí descobri umas cartas de jogar com desenhos: pássaros exóticos, peixes, flores entre muitos outros. E índios.A minha paixão mais recente e também mais antiga do que posso imaginar.

Persépolis II

Li esta crónica de Laurinda Alves sobre o belo e comovente filme Persépolis e apeteceu-me "colá-lo" aqui. Talvez por ter sido escrito por uma pessoa que muito admiro por variados motivos. Há algum tempo atrás tive o privilégio de a conhecer pessoalmente e a minha admiração cresceu ainda mais. Por muitos e variados motivos.
Por tudo isso e muito mais... aqui fica...
"Persépolis

O filme de que se fala e não se pode perder. Muito já foi dito e escrito sobre Persépolis e Marjane Satrapi mas não me parece demais voltar ao tema.
Persépolis é tudo. aquilo que outros classificaram como "arte de grande nível, singular, formidável, político, patético, essencial, terno, provocador, divertido e diferente de tudo o que já foi feito". O Ípsilon escreveu sobre isto e muita mais na semana passada e, noutro contexto, a Newsweek sublinhou a diferença de Persépolis declarando. aos leitores que "não é como nenhum outro filme de animação que já tenham visto". E não. é, de" facto, embora tenha havido outros radicalmente diferentes em registas cinematográficos igualmente surpreendentes (estou a pensar em Sin City, por exemplo).
Há, no entanto, mais adjectivos que se aplicam a Persépolis e, particularmente, a Marjane Satrapi. Elegante pode ser um deles. Profunda e comovente, são certamente outros. E por aí adiante.
A elegância de Marjane não é uma elegância no sentido comum e, porventura, mais frívola da palavra. Não é uma questão de moda, trata-se de uma elegância estrutural que se traduz numa contenção inteligente de palavras e gestos, numa depuração narrativa eficaz e num humor fino, por vezes explosivo, que parte sempre da auto-ironia de quem fala na primeira pessoa mas não se leva demasiado a sério.
Há outros pormenores de elegância no filme como a escolha de Catherine Deneuve e Chiara Mastroiani para darem voz às personagens principais e, ainda, a traço das figuras e cenários.
Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud fizeram um filme quase todo a preto e branco mas encontraram tonalidades admiráveis para desenhar o amor e o ódio, a confiança e o medo e, também, para retratar a noite escura, ampliar a penumbra dos quartos e projectar as sombras nas ruas. Todo o filme é muito gráfico. Há, inclusivamente, uma espécie de preto-alegria e preto-ternura que aliviam o lado mais negro do filme. Os autores usaram, ainda, um espectro muito largo de brancos que vão do branco-susto ao branco-esperança, passando pelo branco-doce e caloroso que emana da cabelo da avó e do tio Anoush, dois pilares da existência de Marjane.
A atitude e a motivação dos personagens é sempre acentuada por essa mesma paleta de cores (ler: preto e branco) e o contraste entre bons e maus deriva especialmente da mancha negra que estes últimas arrastam consigo. São, quase sempre vultos sinistros que emergem das trevas e usam a noite para agir. Cambardes e prepotentes, claro.
Persépolis conta uma história que todos sabemos mais ou menos, embora com outros contornos. Mais humanas e menos políticos no sentido mediático do termo. Não se trata de um documentário político e muito menos de uma análise fria e objectiva da história recente da Irão. É muita mais que isso. É a história de uma família tocada pela guerra, devastada por perseguições, prisões e execuções sumárias de tios, primos, amigos e conhecidos. Uma família onde existe uma filha pequena que assiste a tudo e é obrigada a exilar-se demasiado cedo na Áustria. Por ser uma rapariga iraniana e usar véu na cabeça, Marjane vive as circunstâncias das mulheres da sua cultura. Olhada e apontada com desconfiança, revela um humor feroz mas acaba por encontrar o seu lugar no mundo e triunfar. Não de uma forma triunfalista ou moralista mas daquela forma subtil e invisível que tem a ver com a verdade. E com a liberdade de sermos quem somos, aceitando as nossas origens e história".
Laurinda Alves - Público, 29/02/08

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Persepolis

Filme cheio de beleza tanto a nível visual como a outro mais profundo, polvilhado com humor e tristeza. Subtil e crú também, um olhar muito próprio sobre um país através do olhar da menina/mulher - desde cedo uma observadora dos acontecimentos, sempre atenta e desperta, na revolução e na guerra. A separação da família, longe dos pais, avó, amigos e do mundo que lhe era familiar. A melancolia de quem está longe pontuada com alegria, amores e desilusões.
Estranha no país estrangeiro em busca da liberdade.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

inspiração

Sabe bem embrenhar-me assim, concentrada num ponto único que muda constantemente. É como deixar-me ir na correnteza lúcida de um rio, encontrar o mar apenas assim. Leve, sem dificuldade, meditação embalada por ritmo silencioso forte.
Só sinto o deslizar dos instantes pelas formas que se vão revelando, sem esforço, sem pensamento. Com todo o tempo sem tempo. Chego e parto embalada por uma voz que repete este nome por dentro. E eu vivo por dentro, cá dentro é também fora.
os instantes lentamente ganham formas mágicas
e eu mais real do que nunca



sábado, 16 de fevereiro de 2008

selvagem

A criatividade é transmutação, ajuda a dar o salto para a palavra.
A criatividade ensina a escutar o silêncio e a dar-lhe forma. E isso cura, cura a dor.
A criatividade relembra-nos como o mundo é vasto, como tudo está ligado. Estamos inseridos em algo maior, unidos, todos unidos por fios de música invisível, subtil ligação de luz que nos salva a cada instante. A solidão é quando nos esquecemos que fazemos parte de tudo. Mas o acto de criar é a cura para a essa ilusão. E aí o mundo ganha cores de novo.
E posso voltar a sorrir mesmo a andar assim por este lado selvagem

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

... into the wild ...

No domingo fui ao cinema, não conscientemente com a intenção de ver este filme, mas que acabou por ser a única hipótese tendo em conta a hora e o local escolhido. Sabia por alto do que se tratava. Lera algo que falava do mesmo. Logo aí a minha atenção ficou presa.
Dá que pensar. Mais do que pensar, dá muito que sentir. Marcou-me muito, de uma forma particular. Apesar de inúmeras palavras e ideias me saltarem de todos os lados, não consegui ainda falar sobre esse silêncio. As palavras não querem sair, estão cá dentro, mas não saem. Não me saem da cabeça.
É um silêncio, uma solidão, uma tristeza. Mas tão real. Uma aceitação, sei que não vale a pena continuar a fugir mais. De certa forma é o resultado de um processo interior que se vem prolongando há algum tempo. Como se também eu tivesse embarcado numa viagem sem retorno com destino incerto ainda. Com uma ideia-sensação forte a guiar-me apenas. Sem certezas. Livre.
A liberdade não tem preço. Como é alto o seu preço...
O que pode parecer superficialmente uma mania imatura, sente-se afinal como algo tão forte, profundo e poderoso. É uma entrega ao tempo e ao espaço, aos elementos, à vida. À morte. E a morte, assim como a vida, tem tantos rostos. Tantos nomes, tantas possibilidades!
Não tem sido fácil viver com uma revelação assim tão clara, uma coisa que já sabemos desde sempre, mas que apenas num momento particular sentimos dentro de nós a correr no sangue, a alimentar-nos. Cada dia, cada hora... vi a solidão mais profunda ainda do que imaginara, o balancear entre a vida e da morte... tão frágil, tão forte.
Mesmo neste dia-a-dia, quem é que ainda não passou para esse "lado selvagem"? Coragem, não é fácil, mas vale a pena ser-se quem se é

domingo, 27 de janeiro de 2008

entrega

Sou isto por vezes
só isto

entrego-me
corpo alma
entrego-me
sem mãos braços

coração aberto

entrego-me
desliza luar

guias a minha caminhada
vida morte

Sol! toca aparece surpreende
instantes de luz
translúcida voz
rasgas esta escuridão

escutando as ondas
silêncio